Sílvio Vaz
As Biorrefinarias como Oportunidade de Agregar Valor à Biomassa
08/01/2013 às 19:39 As biorrefinarias fazem parte da agenda de P&D&I da maioria dos
países desenvolvidos e em desenvolvimento, como o Brasil, mobilizando
grandes quantias de recursos e esforços públicos e privados voltados
para o aproveitamento otimizado da biomassa, para agregar valor a essas
cadeias produtivas e reduzir possíveis impactos ambientais das mesmas.
Os
conceitos de biorrefinaria e química verde enfocam o aproveitamento de
modo que haja cadeias de valor similares àquelas dos derivados do
petróleo, porém com menor impacto ao meio ambiente, visando contemplar
sistemas integrados (matéria-prima, processo, produto e resíduos)
sustentáveis.
Nesses casos, são levados em conta parâmetros
técnicos que consideram, dentre outros aspectos, os balanços de energia e
massa, o ciclo de vida e a redução de gases do efeito estufa. Uma
biorrefinaria pode integrar em um mesmo espaço físico processos de
obtenção de biocombustíveis, produtos químicos, energia elétrica e
calor, biomateriais, alimentos, etc.
Em uma escala de valoração
econômica (Figura 1) os produtos químicos desenvolvidos a partir da
biomassa são os que possuem maior potencial em agregar valor a esta
cadeia, em função da participação estratégica da indústria química no
fornecimento de insumos e produtos finais a diversos setores da
economia, como os petroquímico, farmacêutico, automotivo, agronegócio,
cosméticos, de construção, etc.. Biocombustíveis e materiais estão em um
segundo patamar de valoração, seguidos por energia e insumos químicos,
como fertilizantes e defensivos agrícolas.
Como pode ser
observado na Figura 1, ao nos referirmos a uma biorrefinaria, estamos
nos referindo às tecnologias e processos utilizados para a transformação
da biomassa nos cinco tipos de produtos apresentados (energia, insumos
químicos, biocombustíveis, materiais e produtos químicos). As
tecnologias são compiladas em processos os quais, por sua vez, são
relacionados às chamadas plataformas tecnológicas - plataforma
bioquímica, plataforma química e plataforma termoquímica. Pode-se citar
como exemplo: o processo de obtenção de etanol de cana-de-açúcar é a
fermentação por leveduras, que obedece a determinadas técnicas de uso
(ou tecnologias), estando este processo inserido na plataforma
bioquímica de uma biorrefinaria.
Como o conceito de
biorrefinaria é amplo por sua própria definição e abrangente em seu
potencial de aplicação industrial e econômico, pode-se destacar a
chamada desconstrução da biomassa lignocelulósica para uso como
matéria-prima para as plataformas bioquímica e química, excetuando-se
para o caso da plataforma termoquímica, que a utiliza de forma direta.
Na desconstrução, a biomassa, após passar por diversos tipos de
pré-tratamentos físicos e químicos, disponibiliza os polímeros lignina,
celulose e hemicelulose. Quando se utiliza oleaginosas, também não é
necessária esta desconstrução, mas sim a extração do óleo.
Segundo
levantamentos recentes do U.S. Department of Energy (DOE), existe a
possibilidades de utilização da lignina como precursor de produtos
químicos, em sua maioria em alternativa aos derivados de petróleo, a
serem utilizados como antioxidantes, resinas fenólicas, solventes,
agentes antivirais, agentes sequestrantes, preservantes de madeira,
estabilizantes enzimáticos, controladores de vazamento de óleo, dentre
outros. Cabe ressaltar que tais usos dependerão grandemente do tipo de
pré-tratamento aplicado para a obtenção da lignina, já que a mesma
possui estrutura molecular heterogênea e complexa e do uso de
catalisadores químicos.
A celulose e a hemicelulose, uma vez
hidrolisadas, se decompõem em hexoses e pentoses. Os novos produtos
derivados desses açúcares também foram objeto de publicação do DOE,
tendo-se concluído que os derivados desses açúcares de maior potencial
industrial são ácidos carboxílicos como ácido lático e succínico,
etanol, sorbitol, entre outros de menor uso. Tais compostos poderão ser
utilizados como solventes, combustíveis, monômeros para plásticos,
intermediários químicos para a indústria farmacêutica e de química fina
em geral. Neste caso, utiliza-se a plataforma bioquímica (uso de
processos biotecnológicos) associada à plataforma química (uso de rotas
sintéticas).
O biocarvão, por sua vez, é um coproduto de
interesse agronômico para aplicação como fertilizante de liberação
controlada por suas possíveis aplicações na prevenção da poluição
ambiental e na descontaminação de corpos d'água e de solo impactados por
metais tóxicos. Quanto ao bio-óleo, este poderá ser utilizado como
combustível em substituição ao óleo diesel para a produção de calor e
energia, com um menor impacto ambiental. Ambos os produtos são obtidos
na plataforma termoquímica, por meio de processo de pirólise.
Cabe
ressaltar, ainda, as possibilidades de uso da glicerina, que é o
principal coproduto da produção do biodiesel, como matéria-prima para a
obtenção de commodities químicas e de antioxidantes sendo que, assim
como no caso da lignina, este aproveitamento depende do uso de
catalisadores químicos.
Desta forma, as possibilidades advindas
do aproveitamento da biomassa por meio das biorrefinarias a tornam uma
matéria-prima de enorme potencial para o Brasil, país que ainda possui
uma grande deficiência tecnológica em setores químicos e afins. Abre-se,
portanto, uma nova fronteira tecnológica e econômica para o agronegócio
e para a biomassa como matéria-prima renovável e sustentável.
Sílvio Vaz Jr. é pesquisador da Embrapa Agroenergia