Capítulo 5

Calibração de pulverização

Um fator extremamente importante para o sucesso do tratamento fitossanitário de diferentes culturas é a calibração dos pulverizadores que serão utilizados para as aplicações dos agrotóxicos. O objetivo da calibração é colocar a quantidade correta de agrotóxico no alvo (local onde ocorre o ataque dos problemas fitossanitários), com o menor consumo de calda. Se houver uma deposição eficiente, o controle será mais efetivo, e o número de aplicações poderá ser reduzido (CHAIM; PESSOA, 2002).

Entre os pulverizadores, existem alguns que são mais utilizados para aplicar os agrotóxicos em culturas de porte rasteiro, arbustivo ou arbóreo, os quais são escolhidos de acordo com a área cultivada e, principalmente, com o poder aquisitivo do agricultor. Equipamentos como os pulverizadores costais, ou aqueles cuja aplicação é realizada por lanças manuais, produzem gotas que são arremessadas exclusivamente pela força da pressão hidráulica. Esses equipamentos devem ser utilizados, preferencialmente, em pequenas áreas de cultivo ou quando a cultura se encontra nas etapas iniciais do desenvolvimento da massa foliar. Para as culturas de porte arbustivo e arbóreo, os equipamentos que utilizam cortina de ar seriam indicados para todas as etapas de desenvolvimento, porque o jato de ar auxilia na deposição das gotas. Entretanto, quando a cultura encontra-se com a área foliar pequena, é conveniente desligar alguns bicos, ou aumentar a velocidade de deslocamento da máquina, para reduzir o consumo de calda. No caso de culturas de porte rasteiro, também seria conveniente aumentar a velocidade de deslocamento da máquina nas etapas iniciais de desenvolvimento.

Passos para calibração de pulverização para aplicação de agrotóxicos

Para facilitar a compreensão de todos os passos que devem ser seguidos durante a calibração de qualquer tipo de pulverização, serão adotadas, neste tópico, culturas arbustivas e arbóreas como, por exemplo, a videira cultivada em latada e a cultura da maçã (CHAIM; PESSOA, 2002). Nessas culturas, os passos para controle de uma doença seriam os seguintes:

1) Observação do grau de deposição de gotas nos principais locais de ocorrência das pragas e doenças

A observação da deposição pode ser realizada por meio do uso de cartões sensíveis à água – cartões de papel impregnados do corante azul de bromofenol –, que, na sua forma não ionizada, apresenta coloração amarela. Esses cartões estão comercialmente disponíveis no mercado; entretanto, caso não haja possibilidade de adquiri-los, eles poderão ser fabricados pelo próprio usuário. Para isso, prepara-se uma solução que contenha 1 g do produto azul de bromofenol, dissolvido em 20 mL de acetona e diluído em 180 mL de tolueno. Os cartões de papel selecionados devem ter alguma rigidez e apresentar superfície polida brilhante, que impeça a translocação da solução.

Depois de preparada a solução, utiliza-se algodão preso em uma haste de madeira ou em outro material, para passá-la sobre a superfície brilhante do papel, que adquirirá uma coloração amarelada. Nessa situação, ao atingirem a superfície tratada, as gotas de água produzem manchas azuis, que apresentam um bom contraste com o fundo amarelo e podem ser facilmente visualizadas. Na impossibilidade de obtenção e de fabricação do cartão sensível à água, recomenda-se utilizar algum corante na calda de pulverização, de forma que as gotas possam ser observadas diretamente nas folhas das plantas ou em alvos artificiais constituídos de papel comum, cuja coloração intensifique o contraste das manchas. Existem, também, produtos fluorescentes que podem ser observados com iluminação de luz ultravioleta (luz negra).

No caso da parreira, visto que a pulverização é realizada debaixo da latada e orientada verticalmente para cima, os alvos poderiam ser distribuídos em três regiões: região basal – onde ficam os cachos –, região intermediária e região superior (sobre a latada), porque certamente receberão deposições diferentes. Os alvos da região inferior receberão uma deposição muito intensa, já que o bico de pulverização se desloca muito próximo deles, mas fornecem informação importante se comparados com aqueles colocados nas regiões mediana e superior do caramanchão, permitindo avaliar o grau de dificuldade de penetração das gotas.

Quando se trata de controle de doenças da macieira, os alvos deveriam ser colocados nas páginas inferiores das folhas, nas seguintes regiões das plantas: apical, mediana externa, mediana interna, basal externa e basal interna.

Normalmente, gotas grandes (maiores do que 0,25 mm de diâmetro) tendem a depositar-se nas primeiras camadas de folhas, enquanto gotas pequenas (menores do que 0,15 mm de diâmetro) conseguem atingir as camadas das folhas menos expostas. Como o tamanho das gotas é influenciado pela vazão do bico e pela pressão de trabalho, esses parâmetros devem ser testados em conjunto com diferentes velocidades de aplicação, até que a pulverização dê o resultado esperado na cobertura.

A calibração deve ser realizada mediante a utilização de padrões de tamanhos e de densidade de gotas, padrões esses que devem ser selecionados para alvos característicos. Matthews (1982) apresenta uma generalização dos tamanhos de gotas que devem ser utilizados para alvos específicos (Tabela 6). Na prática, não é aconselhável utilizar as gotas menores do que 100 μm recomendadas por Matthews (1982). Dessa forma, os padrões de tamanhos de gotas ilustrados na Figura 16 poderiam ser utilizados.

Figura 16. Padrões de tamanho e de densidade de gotas de pulverização. O tamanho das gotas é o VMD, o qual é medido e classificado pelo programa “Gotas”, desenvolvido na Embrapa Meio Ambiente e na Embrapa Informática Agropecuária. As imagens recuperadas de amostras originais fornecem apenas aspectos visuais de deposição, pois algumas manchas podem ter sido alteradas entre a captura e a transposição para o texto.

No folheto fornecido pela fabricante do cartão sensível à água (SYNGENTA, 2002), distribuído exclusivamente pela Spraying Systems Company, apresenta-se uma tabela com padrões de densidade de deposição para alguns tipos de alvo (Tabela 11).

Tabela 11. Padrões de densidades de deposição mínimas para alguns tipos de pulverização.

Tipo de pulverização Densidade de gotas (nº/cm²)
Inseticidas 20–30
Herbicidas em pré-emergência 20–30
Herbicidas de contato 30–40
Fungicidas 50–70

Fonte: Syngenta (2002).

Normalmente, para o caso de controle de doenças, deposições com densidade superior a 70 gotas por centímetro quadrado são consideradas as mais adequadas para aplicações de fungicidas. Assim, considerando-se os padrões apresentados na Figura 16, gotas entre 200 μm e 300 μm poderiam ser utilizadas nas pulverizações. Portanto, não seria necessário molhar totalmente as folhas até o ponto de escorrimento, porque essa condição de pulverização exigiria elevado volume de calda e seria extremamente desperdiçadora.

2) Avaliação da vazão do equipamento

Assim que o padrão de deposição for atingido, é necessário calcular a vazão dos pulverizadores, a qual poderá ser obtida de duas maneiras diferentes:

a) Método direto

Pulverizar durante um minuto e coletar o líquido em algum tipo de recipiente. Em seguida, medir o volume pulverizado com algum utensílio graduado.

Este método é indicado quando existe facilidade na coleta do líquido pulverizado, e, principalmente, se o agricultor dispõe de algum utensílio com graduações para medir volume como, por exemplo, as provetas.

Entretanto, as provetas são caras e não são facilmente encontradas nas pequenas cooperativas que comercializam insumos agropecuários. Nesse caso, o agricultor deve utilizar o método indireto.

b) Método indireto

Colocar um volume conhecido dentro do tanque do equipamento e pulverizar até o esgotamento do líquido. Cronometrar o tempo consumido para esse procedimento.

Exemplo para um pulverizador tratorizado, do tipo carreta, com cortina de ar:

  1. Adicionar 20 L de água (bem medidos) no tanque do pulverizador.
  2. Acionar o pulverizador, selecionando a rotação do motor usualmente utilizada na pulverização.
  3. Cronometrar o tempo que se gasta para pulverizar os 20 L (ex.: 3 min 15 s).
  4. Converter o tempo para segundos. Por exemplo, se o tempo gasto foi de 3 min e 15 s, multiplica-se a quantidade de minutos por 60 (3 x 60 = 180). Em seguida, soma-se o resultado à quantidade de segundos (180 + 15 = 195). Logo, o tempo total gasto foi de 195 s.
  5. Dividir os 20 L pelo tempo em segundos (20/195 = 0,10256 L/s).
  6. Multiplicar o valor por 60 para obter a vazão em L/min:
    Vazão = 0,10256 x 60 = 6,15 L/min
  7. Caso necessário, dividir a vazão da máquina pelo número de bicos. Exemplo para pulverizador com oito bicos:
    Vazão/bico = 6,16/8 = 0,77 L/min

Essa informação é importante na aquisição de bicos novos. Na compra, deve ser especificada a vazão desejada na pressão de trabalho que se pretende utilizar. Exemplo de especificação: bico leque, ângulo de 80º, com vazão de 0,4 L/min, pressão de 3,2 kg/cm² (ou 45 lbf/pol²).

3) Medir a velocidade de deslocamento da máquina durante uma pulverização

  1. Com uma trena, marcar um percurso de 50 m.
  2. Afastar o trator do local demarcado a uma distância que seja suficiente para imprimir velocidade constante durante a passagem pelo percurso selecionado.
  3. Disparar o cronômetro no momento em que o para-choque dianteiro do trator (ou outro ponto de referência) atingir a marca inicial. Desligar o cronômetro no momento em que o para-choque atingir a marca final dos 50 m. Anotar o tempo gasto e repetir a operação.
    Se, por exemplo, o trator demorar 40 s para percorrer os 50 m, deve-se dividir a distância percorrida pelo trator pela quantidade de segundos consumidos (50/40 = 1,25 m/s). Para transformar em minutos, multiplica-se o resultado por 60:
    Velocidade = 1,25 x 60 = 75 m/min

4) Calcular a distância percorrida para tratar 1 ha

Supondo-se que a faixa de aplicação do pulverizador é de 2,5 m, e considerando-se um hectare como um quadrado de 100 m de lateral.

O número de passadas será:

P = 100/2,5 = 40

Se em cada passada o trator percorre 100 m, em 40 passadas a distância percorrida será:

L = P x 100 = 40 x 100 = 4.000 m

5) Calcular o tempo que será gasto para tratar 1 ha

Para calcular o tempo gasto, divide-se a distância percorrida (4.000 m/ha) pela velocidade de aplicação (75 m/min):

Tempo consumido/ha = 4.000/75 = 53,3 min/ha

6) Calcular o volume de calda que será gasto para tratar 1 ha

O volume de calda gasto será obtido, multiplicando-se a vazão do pulverizador (6,15 LH/min) pelo tempo que se gasta para efetuar a pulverização (53,3 min/ha):

Volume consumido/ha = 6,156 x 53,3 = 328 L/ha

7) Calcular a quantidade de agrotóxicos que deverá ser colocada no tanque do pulverizador

As recomendações de dosagem apresentadas normalmente nas embalagens dos agrotóxicos podem ser expressas em:

  1. Quantidade do produto em g/ha ou em mL/ha.
  2. Quantidade do produto em g/100 L ou em mL/100 L, com recomendação de um volume mínimo de calda, que deve ser utilizado para controle eficiente de pragas e de doenças.

A recomendação expressa em gramas ou em mililitros por 100 L é amplamente utilizada pelos agricultores, em razão da facilidade dos cálculos para preparo da calda. Entretanto, essa recomendação só deve ser utilizada quando se emprega grande volume de calda, ou seja, acima de 500 L/ha, obedecendo-se à recomendação do fabricante do agrotóxico.

Por exemplo, para um consumo de 328 L/ha, o agricultor deverá utilizar uma recomendação que especifique a dosagem do agrotóxico em gramas ou em mililitros por hectare.

Exemplo:

Supondo-se que o agricultor utilizará um fungicida para controle de uma determinada doença. No rótulo ou na bula da embalagem, o agricultor encontra a recomendação de dosagem de 1,5 L/ha a 2,0 L/ha do produto comercial. Em virtude das características da cultura e do elevado risco de infestação da doença, o agricultor optou por aplicar a dosagem de 2,0 L do produto comercial por hectare. Considerando-se que a área cultivada pelo agricultor é de 5 ha e que o equipamento devidamente calibrado aplica um volume de calda equivalente a 328 L/ha, o consumo total de calda para tratar a cultura será: 5 x 328 = 1.640 L. Supondo-se que a capacidade do tanque do pulverizador é de 500 L, o agricultor poderia simplesmente adicionar 328 L de água no tanque e os 2,0 L do produto, e tratar, com cada maquinada, um hectare de cada vez. Com isso, seriam realizados cinco preparos de calda e de abastecimentos. Entretanto, para economizar combustível, o agricultor pode realizar apenas quatro preparos de calda, colocando no tanque do pulverizador, em cada aplicação, 410 L de água. Nesse caso, a dose de produto comercial a ser adicionada no tanque seria:

Para o caso do exemplo anterior, o resultado seria:

D = 2,5 L de produto comercial para cada preparo de calda (410 L)