Capítulo 2
O objetivo principal de uma pulverização é a aplicação da quantidade mínima de ingrediente ativo sobre o alvo para a obtenção de um máximo de eficiência, sem contudo contaminar as áreas adjacentes – não alvo.
Os agrotóxicos devem ser aplicados em áreas atacadas por pragas, doenças e plantas daninhas. O aumento da contaminação do meio ambiente em razão da deriva de produtos químicos tóxicos tem sido motivo de frequentes condenações às pulverizações, principalmente quando os efeitos delas são visíveis.
Em se tratando de determinados inseticidas, os efeitos não são facilmente detectáveis. Porém, no caso da aplicação de alguns herbicidas, como a do 2,4-D, mesmo a quilômetros de distância certas plantas podem exibir sintomas de intoxicação, dada a ação do vento. Por exemplo, resíduos de organofosforados foram detectados no leite de vacas alimentadas nas proximidades de área com ele tratada (MATTHEWS, 1982). As perdas que ocorrem durante as aplicações de agrotóxicos são originadas de um conjunto de causas.
Em pulverizações com grandes volumes de calda, muitas gotas caem em meio às folhagens, especialmente nos espaços entre as plantas, e atingem o solo. Ocorre também de uma grande quantidade de gotas atingirem as folhas, coalescerem e formarem gotas maiores que, por não mais conseguirem ficar retidas, escorrem para as partes inferiores das plantas e, por fim, caem no solo (COURSHEE, 1960).
A pulverização que objetiva molhar totalmente as plantas é muito praticada atualmente, apesar de ter sido “inventada” no século 19. Na prática, o que ocorre nesse tipo de aplicação é o fato de a retenção do produto químico por parte das folhas ser menor do que no caso de a pulverização ser interrompida exatamente antes do início desse escorrimento. Como tal interrupção dificilmente é conseguida, a quantidade de produto retida nas folhas é proporcional à concentração da calda e independe do volume aplicado. Se o pretendido for reduzir o volume de aplicação, serão necessárias uma produção e uma distribuição adequadas de gotas pequenas, e, nesse caso, as perdas por evaporação e por deriva podem ser acentuadas.
Atualmente, as recomendações contidas nos rótulos das embalagens dos agrotóxicos deixam a seleção do volume de aplicação a critério do aplicador. Algumas delas dão opções de 200 L a 1.000 L de calda por hectare. Na prática, o usuário utiliza um mesmo volume para uma grande variedade de pragas e para os vários estádios de crescimento da cultura. Assim, o volume aplicado pode ser ou excessivo, caso a cultura se apresente com pequena quantidade de folhas, ou insuficiente para fornecer uma boa cobertura, caso as plantas já estejam desenvolvidas (MATTHEWS, 1982).
O volume adequado de agrotóxico a ser aplicado depende do tipo de tratamento que se deseja executar, mas o tamanho das gotas geradas pelos bicos determina a distribuição do agrotóxico no alvo. Apesar disso, pouca atenção tem sido dada ao tamanho delas, e uma grande variedade de bicos tem sido utilizada ao longo dos anos, dos quais a maioria produz um espectro de gotas de tamanhos variados. Em muitos casos, as gotas grandes se chocam com as folhas mais expostas, em virtude disso não conseguem penetrar e ficar retidas nas superfícies “escondidas” do vegetal. Esse choque externo pode se dar em tal intensidade a ponto de fazer que as gotas escorram e se depositem no solo, produzindo, dessa forma, aquilo que se denomina endoderiva (ver Glossário).
No caso das gotas pequenas, mais adequadas para a penetração entre as folhas da planta, essas podem ser levadas pelo vento para fora da área tratada e, assim, provocarem a exoderiva (ver Glossário). Além disso, gotas pequenas são mais propensas à evaporação.
O tamanho de gota ótimo é, portanto, aquele que promove o máximo de deposição de produto no alvo com um mínimo de contaminação do meio ambiente (HIMEL, 1969; HIMEL; MOORE, 1969).
A contaminação do solo pode provocar grandes variações nas populações de organismos que não são alvos, principalmente aqueles que degradam a matéria orgânica e melhoram a fertilidade. Muitas vezes, essas perdas são responsáveis por desequilíbrios favoráveis ao aparecimento de novas pragas e doenças. Um solo contaminado pode ser levado pelas águas da chuva para rios, açudes e lagos, e, com isso, colocar em risco não só as populações que vivem nesses sistemas como também os indivíduos que se utilizam dessa água para a sua sobrevivência, como os animais e o próprio homem.
Para compensar perdas havidas durante as aplicações, em geral as dosagens aplicadas são extremamente superestimadas. Por exemplo, Brown (1951) já afirmava que, para matar um determinado inseto, seria necessário apenas 0,0003 mg de um determinado produto; e, para controlar uma população de 1 milhão de indivíduos (capaz de promover dano econômico para a cultura), seriam necessários somente 30 mg do mesmo produto. Apesar disso, nas aplicações efetuadas no campo eram utilizadas mais de 3 mil vezes a dose necessária para obter-se um controle adequado.
A aplicação de agrotóxicos tem sido caracterizada como uma ciência aplicada, de natureza multidisciplinar por envolver conhecimentos de diferentes áreas como biologia, engenharia e química (MATTHEWS, 1982). A necessidade de conhecimentos da biologia está relacionada, principalmente, com os níveis de controle baseados em critérios econômicos como, por exemplo, a densidade crítica de ervas daninhas ou a população máxima de determinados insetos. Os requisitos biológicos determinam parâmetros como nível de concentração dos agrotóxicos, tamanho e número de gotas, os quais podem ainda variar de acordo com o alvo e o modo de ação do produto aplicado, para que se atinja um nível satisfatório de controle (COMBELLACK, 1981).
Vários fatores estão envolvidos na relação entre as gotas e o alvo, os quais, em razão do número dessas interações, determinam a retenção ou a perda do agrotóxico. Entre esses fatores, estão a forma do alvo (JOHNSTONE, 1973), a natureza física da superfície e o ângulo de incidência das gotas em relação à superfície. Os fatores que influenciam o impacto e a retenção das gotas no alvo são o tamanho delas e a pressão com que são pulverizadas, além das condições micrometeorológicas durante a aplicação.
O tipo de formulação do produto, sua viscosidade, bem como o veículo líquido usado na pulverização, também exercem uma importante influência na retenção das gotas pelo alvo (COMBELLACK, 1981).
A eficiência do movimento da gota em direção ao alvo é influenciada tanto pelo processo de aplicação como pelas características da formulação do produto. Nessa fase, a gota é influenciada pelas condições da natureza, como a temperatura, a umidade relativa do ar, a velocidade vertical e horizontal do vento, a turbulência do ar e a pressão atmosférica.
Para maior eficiência da ação dos agrotóxicos, os alvos precisam ser definidos em termos de espaço e de tempo, de modo que a quantidade de produto necessária ao combate de pragas e de doenças possa ser determinada, assim como prevista a sua disponibilidade.
A definição do alvo biológico exige conhecimento da biologia da praga, para que se determine em qual estágio ela é mais suscetível ao agrotóxico.
No caso dos insetos, muitas vezes apenas uma parte da população deles pode estar suscetível num determinado momento, por seu ciclo de vida apresentar vários estágios distintos como, por exemplo, de ovos, de ninfas, de larvas e de pupas. As dificuldades na definição dos alvos levam, portanto, ao uso de produtos químicos mais persistentes.
O conceito de proteção das culturas implica o propósito de redução da população da praga ou de um estágio de seu desenvolvimento, que seja diretamente responsável pelos danos em determinadas culturas. Logo, a proteção da cultura será mais eficiente quando os agrotóxicos forem economicamente aplicados numa escala determinada tanto pela área ocupada pela praga quanto pela urgência com que a população deve ser controlada (MATTHEWS, 1982).
Em muitos casos, o controle tem sido dirigido para o estágio larval dos insetos. Essa prática tem apresentado grande sucesso quando os tratamentos são suficientemente precoces para reduzir a quantidade das larvas de inseto que estão se alimentando. Se o tratamento é tardio, além de ser necessária uma dose maior para controlar a praga, muitos danos já podem ter sido causados. Entretanto, o combate em estágios larvais tem pouco ou nenhum efeito sobre os ovos, as pupas ou os insetos adultos, e pode exigir a repetição dos tratamentos à medida que se desenvolvem outras larvas.
Um exemplo clássico disso ocorre no caso do combate à cochonilha Orthezia praelonga, em que a aplicação de um inseticida fosforado pode resultar na mortalidade de 100% dos adultos; embora, depois disso, novos adultos possam ser encontrados, porque esse tipo de praga deposita seus ovos em uma estrutura denominada “ovissaco”, a qual fica protegida da ação dos agrotóxicos, e, assim, à medida que os ovos eclodem, surgem novos indivíduos. Nesse caso, o tratamento precisa ser repetido.
Num sistema de manejo de pragas, as informações biológicas devem conter mais que simples descrições do ciclo de vida e fornecer subsídios para a compreensão da ecologia da praga. É necessário conhecer também o movimento da praga nas áreas ecológicas, assim como a relação dela com os diferentes hospedeiros.
Para determinadas espécies de pragas, o alvo pode variar de acordo com:
Descrever cada um dos fatores separadamente é muito difícil, pois eles dependem de suas próprias inter-relações.
O tripes (Enneothrips flavens) do amendoim, por exemplo, é uma praga que fica protegida entre os folíolos fechados da planta. Nesse caso, para combatê-la, é necessário empregar um inseticida que apresente um forte efeito irritante, como os piretroides, para desalojar os insetos forçando-os a caminhar sobre as regiões da planta contaminadas com o agrotóxico. Entretanto, as cigarrinhas são pragas que têm o hábito de se movimentar muito pela planta, e, de certa forma, isso facilita o seu controle, mesmo com uma deposição irregular de agrotóxicos sobre as estruturas do vegetal.
No caso das cochonilhas com carapaça, que são insetos imóveis, esses dificilmente sofreriam a ação dos inseticidas de contato. Todavia, a carapaça que os protege da ação do inseticida também pode ser utilizada para matá-los se uma fina camada de óleo emulsionável for aplicada sobre a superfície do vegetal, de modo que impeça a entrada de ar para o interior dessa estrutura e provoque a asfixia dos insetos.
Em se tratando de controle das doenças, deve-se considerar que um patógeno típico de plantas apresenta, basicamente, quatro fases:
Assim, o ideal seria que o controle fosse feito antes da penetração do hospedeiro na planta, pois é possível que os esporos possam atingir as plantas em uma série de períodos muito curtos, quando as condições favorecem a sua dispersão. A rápida penetração no hospedeiro limita o tempo disponível para a ação efetiva de fungicidas aplicados nas folhas, a menos que um fungicida sistêmico possa interromper o desenvolvimento da fase de invasão. Na maioria dos casos, o fungicida tem de ser aplicado em várias ocasiões para limitar a dispersão da doença. Variações que ocorrem de área para área e de ano para ano dificultam a organização de um plano das aplicações, de maneira que as pulverizações são feitas de forma preventiva para evitar a possibilidade de condições meteorológicas desfavoráveis durante a epidemia.
Quando é possível, os agricultores têm preferido o uso do tratamento profilático das sementes. Entretanto, esse tratamento só é efetivo durante a germinação e depende muito das condições de umidade do solo e do grau de cobertura das sementes.
Para o controle de ervas daninhas, os alvos para os herbicidas podem ser:
A escolha da técnica de aplicação depende não só do alvo como também da facilidade de penetração e de translocação do herbicida nas plantas. O ideal é o agricultor estar preparado para evitar a germinação das sementes das ervas daninhas com um produto seletivo, de forma que a cultura possa estabelecer-se livre de competição.
Alguns herbicidas de solo devem ser aplicados antes do plantio, pelo fato de sua distribuição no pré-plantio ser muito importante. Isso ocorre quando uma pequena quantidade do produto, normalmente menos do que 5 kg, é distribuída numa camada de 2 cm a 5 cm do solo, em um hectare (MATTHEWS, 1982).
Os herbicidas de pós-emergência devem ser aplicados na superfície do solo, durante a germinação da cultura ou imediatamente após. Um cuidado muito grande deve ser tomado na aplicação dos herbicidas seletivos, pois a seletividade pode não ocorrer se for aplicada uma superdose. Nesse caso, o bico de pulverização deve ser cuidadosamente escolhido para evitar que gotas atinjam a cultura. Frequentemente, é necessário o uso de defletores ou de protetores.
Há, noutros casos, basicamente dois tipos de plantas e de folhagens de erva daninha a serem considerados em se tratando da deposição do herbicida: as folhas estreitas das monocotiledôneas, como os capins; e as folhas largas das dicotiledôneas; haja vista as diferenças consideráveis de detalhes de estruturas nas folhas que afetam a retenção das gotas.
Muitas vezes, o modo de ação do herbicida facilita a sua aplicação, como no caso do glifosato, que é sistêmico e, se for aplicado sobre as folhas, desloca-se para os rizomas e as raízes e mata a planta.
Se os métodos culturais e biológicos de controle são eficazes, ou se a população da praga não atingiu ainda níveis que justifiquem o custo da aplicação do produto, o uso do agrotóxico não é necessário. Cabe aos técnicos identificar a presença de pragas, de doenças e de plantas daninhas; avaliar se estão ocorrendo a ponto de causar danos econômicos; e orientar caso haja necessidade de intervenção com a pulverização.
O uso incorreto de agrotóxicos para prevenir ou contornar problemas fitossanitários das culturas acaba por causar sérios impactos ambientais; entre os quais as intoxicações ou doenças graves no homem, resistência da praga ao produto, contaminações de solo e de água, morte de inimigos naturais, etc.
O Manejo Integrado de Pragas (MIP) deve ser praticado sempre que disponível para a cultura (Figura 1). Trata-se de uma filosofia de trabalho direcionada para o controle de pragas agrícolas, que considera, em sua proposta, a aplicação de métodos baseados no estudo da interação praga/planta hospedeira/meio ambiente. Com o MIP, o homem torna-se capaz de acompanhar o nível populacional da praga e de sugerir ações de controle propícias a reduzi-lo e, desse modo, torná-lo aceitável para a produção comercial do produto agrícola.
Figura 1. Representação de um modelo de MIP.
O MIP integra aspectos econômicos, sociais, ecológicos e culturais específicos para a região onde será utilizado e, assim, pode existir mais de uma proposta de MIP, até mesmo para uma mesma região. Para fins de um controle ambiental mais seguro, orienta-se a escolha de propostas que tenham como eixo principal o controle biológico natural associado a outras técnicas, tais como o uso de armadilhas de feromônio e de agrotóxicos seletivos, além daquelas relacionadas à remoção de restos culturais e de bordaduras.
No MIP, não basta só a incidência da praga para que o controle químico seja iniciado, pois deve ser avaliado também sob a ótica financeira. O monitoramento da população da praga, evidenciada pelos sintomas de ataque ou de alimentação deixados nas estruturas da planta, indica se é inevitável ou não a sua redução imediata. Além disso, alguns outros indicadores utilizados devem ser avaliados antes de se iniciarem as pulverizações com agrotóxicos.
O limiar econômico (LE) é a densidade populacional da praga que causaria a primeira perda estatística da produção. Outro índice a ser considerado é o nível econômico de dano (NED), pelo qual se estima se a densidade populacional da praga que causaria dano equivaleria ao custo de uma operação de controle. Portanto, se a população atingir o NED, ocorrerá o comprometimento financeiro da produção, além de prejuízos adicionais relacionados aos custos da pulverização dos agrotóxicos. Por essa proposta, portanto, indica-se que a tomada de ação do MIP se orienta pelo LE.
A tecnologia de aplicação de agrotóxicos atualmente empregada é extremamente desperdiçadora e decorre da falta de conhecimentos básicos sobre a multidisciplinaridade e o funcionamento da cadeia dos processos envolvidos nessa ciência aplicada. Soma-se a esse problema a falta de treinamento dos agrônomos, dos agricultores e/ou de outros profissionais ligados à fitossanidade. Uma maior eficiência da aplicação requer seleção correta de equipamento, com bico de pulverização que produza gotas adequadas ao alvo; volume de calda preparada na concentração que permita a deposição de um resíduo ótimo para o controle da praga; precauções com as condições meteorológicas; identificação e conhecimento da biologia do alvo da aplicação; e, principalmente, adoção de uma prática de manejo integrado do problema fitossanitário.
São necessários poucos gramas de ingrediente ativo para controlar os problemas fitossanitários de uma determinada área. Na maioria dos casos, os ingredientes ativos não possuem as características físicas necessárias para serem aplicados, diretamente, com os equipamentos comerciais. Assim, recebem a adição de uma série de adjuvantes que estabelece uma “formulação”. Numa questão puramente física e matemática, dispõe-se de um pequeno volume a ser espalhado em uma grande área. Dessa forma, a maioria das formulações é desenvolvida para ser diluída novamente em água.
E, mesmo diluída em água, seu volume final é ainda insuficiente, para que o produto químico entre em contato com toda a área da superfície do alvo. É necessário, portanto, aumentar a superfície do líquido para que ele possa ser espalhado uniformemente na área alvo. A única maneira de se aumentar a superfície do líquido, para que ele possa ser distribuído uniformemente numa grande área, é dividindo-o em partículas líquidas denominadas gotas.
O número de gotas que podem ser produzidas com um determinado volume de líquido é inversamente proporcional ao seu diâmetro elevado ao cubo. De acordo com Matthews (1982), o número médio de gotas que se depositam por centímetro quadrado em uma superfície plana pode ser calculado por:
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(1) |
em que:
n = número médio de gotas que se depositam por cm2;
d = diâmetro da gota (μm); e
Q = L/ha (litros por hectare).
Assim, a densidade teórica de gotas do mesmo tamanho obtida quando se pulveriza 1 L/ha, considerando-se que a superfície seja plana, é dada na Tabela 4.
Tabela 4. Densidade teórica de gotas quando se pulveriza um litro por hectare.
Diâmetro das gotas (μm) | Nº de gotas (por cm2) |
10 | 19.999 |
20 | 2.387 |
50 | 153 |
100 | 19 |
200 | 2,4 |
400 | 0,298 |
1.000 | 0,019 |
As pulverizações produzem um grande número de gotas: pequenas esferas de líquido, das quais a maioria é menor que 0,5 mm.
Conforme afirmado anteriormente, o tamanho das gotas é muito importante para que os agrotóxicos sejam aplicados eficientemente com um mínimo de contaminação do meio ambiente. Daí as pulverizações dos agrotóxicos serem normalmente classificadas de acordo com o tamanho das gotas (Tabela 5).
Tabela 5. Classificação das pulverizações conforme o tamanho das gotas.
Diâmetro mediano volumétrico (μm) | Classificação da pulverização |
<50 | Aerossol |
51–100 | Neblina |
101–200 | Pulverização fina |
201–400 | Pulverização média |
>400 | Pulverização grossa |
>500 | Garoa |
A pulverização aerossol é adequada para combate sob deriva, contra insetos voadores. As pulverizações aerossóis, com gotas de 30 μm a 50 μm e neblina, são ideais para tratamento de folhagens em aplicações com volumes ultrabaixos – menos de 5,0 L/ha. Se é preciso reduzir a deriva, a pulverização média e a pulverização grossa são as mais adequadas, independentemente do volume aplicado. A pulverização fina é adequada quando necessário um ajuste entre reduzir a deriva e promover uma boa cobertura.
O tamanho das gotas é expresso como um diâmetro de uma gota em voo, medido em micrômetros (μm) – um micrômetro é 1/1000 mm. Quando se chocam com os alvos, as gotas se espalham e deixam de ser uma esfera, e, assim, fornecem uma falsa impressão do seu tamanho original. A intensidade do espalhamento depende da formulação e da natureza da superfície do alvo.
A maioria dos dispositivos usados para a pulverização não consegue produzir gotas de um único tamanho. Há, portanto, numa pulverização convencional, uma variação do tamanho das gotas referido como “espectro de gotas”, e é importante compreendê-lo em sua relação com recuperação pelo alvo.
Os espectros de gotas são categorizados de acordo com o tamanho médio de suas partículas. Os dois padrões internacionais utilizados para defini-los são o diâmetro mediano volumétrico (VMD) e o diâmetro mediano numérico (NMD).
O parâmetro mais comum para expressar o tamanho das gotas é o diâmetro mediano volumétrico (VMD). Nesse caso, soma-se o volume de todas as gotas de uma amostra representativa, e o VMD será o diâmetro da gota que dividirá a amostra em duas partes iguais, de maneira que metade do volume seja composto por gotas menores que o VMD, e metade por gotas maiores que ele. Nesse parâmetro, umas poucas gotas grandes podem ser responsáveis por uma enorme proporção do volume total da amostra, e isso aumenta o valor do VMD, que, sozinho, não serve para indicar a variação do tamanho das gotas.
Assim, um outro parâmetro, o do diâmetro mediano numérico (NMD), divide a amostra de gotas em duas partes iguais pelo número, sem referência aos seus volumes, de maneira que metade do número de gotas seja menor que o NMD, e metade maior. Esse parâmetro enfatiza as gotas menores, as quais quase sempre estão em maiores proporções numa amostra. Pelo fato de o VMD e o NMD serem afetados por proporções de gotas grandes e de gotas pequenas, respectivamente, a relação entre os dois parâmetros é utilizada para expressar o grau de uniformidade dos tamanhos. A relação entre VMD e NMD fornecerá, pois, um indicativo da uniformidade do espectro, de modo que o tamanho das gotas será mais uniforme quanto mais próxima de 1 estiver essa relação.
A determinação do VMD e do NMD consome muito tempo pelo fato de requerer a coleta e a mensuração de um grande número de gotas. Existem métodos de medição que usam tecnologia laser, que ainda é muito cara e restrita a alguns laboratórios ou estabelecimentos de pesquisa europeus ou americanos. Apesar disso, para a maioria das operações comerciais, tem sido empregada a seguinte equação:
VMD = 0,45 × Dmax |
(2) |
em que Dmax é o diâmetro da maior gota, e é importante utilizar uma amostra suficientemente grande para obter o seu valor.
Embora forneçam apenas uma pequena indicação da variedade de gotas, o VMD e o NMD são medidas úteis para a caracterização das pulverizações, mesmo porque não há um outro meio para quantificá-las. Além disso, a relação VMD/NMD é muitas vezes utilizada como uma referência, pois, como um pequeno número de grandes gotas contém mais líquido que um grande número de pequenas gotas, o VMD será sempre maior que o NMD. Essa relação dá uma indicação da variação do tamanho das gotas.
Existe uma diversidade muito grande de alvos para as aplicações de agrotóxicos. Como os agrotóxicos são biologicamente muito ativos, a eficiência da aplicação pode ser melhorada, se selecionado um tamanho ótimo de gota para aumentar a quantidade de produto que atinge o alvo e a ele adere. É necessário pesquisar para definir o tamanho ótimo de gota para cada tipo de alvo, entretanto Matthews (1982) apresenta uma tabela com algumas generalizações (Tabela 6).
Tabela 6. Tamanho ótimo de gotas para alguns tipos de alvo.
Alvos | Tamanho de gotas (μm) |
Insetos em voo | 10–15 |
Insetos em folhagem | 30–50 |
Folhagens | 10–100 |
Solos ou redução de deriva | 250–500 |
Fonte: Matthews (1982).
A seleção do tamanho das gotas deve ser bastante criteriosa. Por exemplo, supondo-se que uma gota de 50 μm possui a dose letal de certo inseticida para determinado inseto, uma gota de 200 μm teria uma dose 64 vezes maior. Mas se as duas gotas fossem perdidas, a maior desperdiçaria 64 vezes mais produto que a menor.
As gotas são coletadas na superfície dos insetos ou das plantas por dois processos: sedimentação ou impacto, dos quais este último é mais importante para gotas aerossóis (<50 μm).
A deposição por impacto é proporcionada por uma interação complexa do tamanho e da velocidade das gotas com o tamanho do alvo. Em geral, a eficiência da coleta aumenta, proporcionalmente, com o aumento da velocidade relativa e do tamanho da gota, e diminui à medida que aumenta o tamanho do alvo. Submetida à ação de um fluxo de ar constante, uma gota de 10 μm conseguiria desviar-se de uma laranja colocada na sua trajetória; mas provavelmente não conseguiria desviar-se de um fino fio de cabelo.
Nas folhas, o impacto das gotas depende da posição da superfície da folha em relação à trajetória das gotas. Grande parte das gotas é coletada por folhas balançando sob a ação da turbulência do ar. Entretanto, se a velocidade do vento for muito grande – e isso ocorre frequentemente em pulverizações com equipamentos que produzem correntes de ar em alta velocidade –, a folha pode assumir uma posição paralela ao jato de ar, de forma que apresente uma área mínima para interceptar as gotas.
O tipo de superfície dos alvos pode afetar sensivelmente a deposição, como é o caso das pilosas ou serosas, que não conseguem reter as gotas. Quando isso ocorre, é necessário adicionar na calda de pulverização algum produto que reduza a tensão superficial para melhorar o molhamento, ou o espalhamento, bem como a adesão das gotas às folhas.
Quando se pratica a pulverização com grandes volumes de calda, a intenção é promover uma cobertura completa das plantas, e isso nem sempre é conseguido. Para a redução do volume de aplicação, é preciso aplicar gotas de forma dispersa, e, exceto em poucos casos, o controle não tem sido tão bom como o obtido com a aplicação de grandes volumes.
Para a aplicação de pequenos volumes de calda, é necessário conhecer a densidade, a distribuição e o tamanho das gotas que se depositam no alvo, de maneira que a quantidade do ingrediente ativo do agrotóxico seja suficiente para um controle efetivo do problema fitossanitário.
Na aplicação de produtos sistêmicos, a distribuição de gotas não influencia o resultado do controle, porque o produto é absorvido pelas plantas e redistribuído pelo seu sistema de circulação de seiva. Entretanto, quando o produto tem ação de contato, a densidade e a distribuição afetam sensivelmente o resultado do controle.
Insetos que apresentam grande mobilidade – como as cigarrinhas e algumas espécies de lagartas – podem ser facilmente controlados sem uma cobertura completa dos alvos. Mas, para o controle de insetos minadores de folhas e de algumas espécies de cochonilhas, a cobertura tem de ser bastante uniforme. Alguns trabalhos têm demonstrado ser necessária a deposição de uma gota, com pelo menos 100 μm de VMD, por milímetro quadrado de folha, para o controle de uma determinada cochonilha em citros. O controle de doenças fúngicas sem uma cobertura completa pode parecer impossível caso a hifa do fungo penetre na folha no local da deposição do esporo. Entretanto, Matthews (1982) reportou que cada gota possui uma zona de influência fungicida, de modo que, se as gotas estiverem distribuídas dentro de distâncias adequadas, a proteção será muito boa.
A deposição das gotas de agrotóxicos sobre um alvo definido está sujeita a uma série de influências de parâmetros. Embora as influências relativas à velocidade do vento e à temperatura possam ser parcialmente controladas pela escolha do momento da aplicação, outras como a estabilidade atmosférica, a turbulência, a umidade relativa e a eficiência de coleta de gotas pela cultura estão fora de controle.
Associado à atual geração de produtos químicos, de equipamentos e de técnicas, o conhecimento do mecanismo dessas influências auxilia no planejamento das aplicações para obtenção de máxima eficiência.
Durante a pulverização, as gotas passam por alguns tipos de influência, que determinam se elas atingem o alvo ou se são levadas à deriva. A importância relativa dessas influências dependerá do tipo da aplicação, do sistema de pulverização e das condições micrometeorológicas no momento da aplicação.
Influência do equipamento – A sedimentação das gotas é afetada pela velocidade com que elas são projetadas para o alvo, pela turbulência criada pelo próprio jato, ou pelo vento provocado pelo equipamento.
Influência do microclima – A partir do momento em que a gota está livre da influência do equipamento, ela será afetada pelas condições de turbulência e de ventos predominantes. Dependendo da velocidade do vento e da altura da cultura, as turbulências podem ser maiores, iguais ou menores que a velocidade média de sedimentação do espectro das gotas. Dentro das culturas, com exceção das florestas onde a folhagem é densa, a velocidade média do vento é muito baixa, e as gotas de tamanho superior a 45 μm tendem a sedimentar-se sobre as superfícies.
Em todos os estágios da trajetória das gotas, o tamanho delas sofrerá uma diminuição em virtude da evaporação, e, nesse caso, a temperatura e a umidade relativa devem ser consideradas, principalmente no caso de pulverizações à base de água. Como será indicado posteriormente, isso é mais significativo para gotas menores que 150 μm.
O objetivo do estudo da dispersão das gotas é compreender a interação de todos esses processos, para fazer previsões dos depósitos sobre os alvos, não alvos e da deriva. Algumas discussões sobre dispersão de gotas e de particulados envolvem alguns conhecimentos de aspectos fundamentais em Física.
A evaporação ocorre em duas circunstâncias: quando a energia é transportada para uma superfície em evaporação e quando a pressão de vapor do ar estiver abaixo de um valor de saturação. A pressão de vapor saturado aumenta com a temperatura. A variação do estado de líquido para vapor requer energia para ser gasta na expansão das atrações intermoleculares das partículas de água. Essa energia é geralmente fornecida pela radiação solar e suplementada pela remoção de calor do meio envolvente, mas a evaporação causa uma aparente perda de calor e uma consequente queda de temperatura. O calor latente de vaporização para evaporar 1 g (um grama) de água em 0 °C é de 600 cal.
A taxa de evaporação depende de uma série de fatores, dos quais os mais importantes são a diferença entre a pressão de saturação de vapor da água e a pressão de vapor do ar, bem como a existência de um fornecimento contínuo de energia para a superfície. A velocidade do vento pode também afetar a taxa de evaporação, pois o vento é geralmente associado à importação de ar fresco e não saturado, o qual absorverá a umidade disponível.
Numa pulverização, a perda de líquido por evaporação depende muito da temperatura e da umidade relativa, mas também da composição da calda e do tamanho das gotas. A temperatura e a umidade relativa são incontroláveis e podem ser alteradas apenas pela seleção do momento da aplicação, de acordo com as variações diurnas do local da aplicação. As gotas grandes – de tamanho superior a 150 μm – caem relativamente rápido e não são significativamente afetadas pela evaporação quando se pulveriza com aeronaves em voo de até 3 m de altura, ou com pulverizadores tratorizados de barra, para aplicação em culturas rasteiras.
Contudo, à medida que o tamanho das gotas diminui ocorre um rápido aumento na relação entre a área de superfície e o volume delas e, consequentemente, da taxa de evaporação. Para complicar o problema, a velocidade de sedimentação – ou velocidade terminal – também diminui à proporção que as gotas ficam menores. Isso indica que o tempo para a gota atingir a cultura fica mais longo, o que aumenta, por sua vez, o tempo disponível para a evaporação. Se a evaporação atingir o ponto em que o líquido evapora totalmente, uma partícula de resíduo do material ativo ficará flutuando no ar e poderá ser levada, à deriva, a distâncias consideráveis, antes de se depositar. A Tabela 7 apresenta o tempo de vida e a distância de queda das gotas, em ar parado, em diferentes condições de temperatura e de umidade relativa.
Tabela 7. Tempo de vida e distância de queda de gotas em ar parado, em diferentes condições de temperatura e de umidade relativa.
Tamanho original da gota (μm) | T=20 ºC ∆T=2,2(1) UR=80% |
T=25 ºC ∆T=4,0 UR=72% |
T=30 ºC ∆T=7,7 UR=50% |
|||||
t=(s)(2) | D=(m)(3) | t=(s) | D=(m) | t=(s) | D=(m) | |||
30 | 5 | 0,07 | 3 | 0,4 | 1 | 0,02 | ||
50 | 14 | 0,30 | 8 | 0,29 | 4 | 0,15 | ||
70 | 28 | 2,05 | 15 | 1,13 | 8 | 0,58 | ||
100 | 57 | 8,52 | 31 | 4,69 | 16 | 2,44 | ||
150 | 128 | 43,14 | 70 | 23,73 | 37 | 12,33 | ||
200 | 227 | 136,36 | 125 | 75,00 | 65 | 38,96 | ||
300 | 511 | 690,34 | 281 | 379,69 | 146 | 197,24 | ||
400 | 909 | 2.181,81 | 500 | 1.200,00 | 290 | 623,37 |
(1) ∆T = diferença de temperatura entre termômetros de bulbo seco e úmido.
(2) t = segundos.
(3) D = metros.
Pode ser observado que, à medida que aumenta a diferença entre as temperaturas dos termômetros de bulbo seco e úmido (depressão psicrométrica), também a taxa de evaporação aumenta consideravelmente.
A evaporação de gotas pode ser considerada o principal fator determinante da eficiência da aplicação de agrotóxicos. Isso ocorre, em parte, porque a eficiência da aplicação é inversamente relacionada ao tamanho das gotas; ou seja, a maioria das pesquisas indica que a eficiência das aplicações aumenta à medida que se empregam gotas de tamanhos muito pequenos.
Alguns pesquisadores afirmam que a eficiência é maior quando as gotas têm menos do que 100 μm de VMD, e isso não só no controle de pragas e doenças, mas também na aplicação de herbicidas. Na prática, quando se empregam caldas diluídas em água, as pulverizações com gotas menores que 60 μm evaporam tão rapidamente que seria impossível utilizá-las sob determinadas condições micrometeorológicas.
Um dos fatores que afetam a evaporação das gotas é sua área de contato com o ar. A área de superfície de um líquido aumenta em grandes proporções quando ele é quebrado em gotas.
A área de superfície de uma esfera é dada pela seguinte equação:
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(3) |
em que:
S = área da superfície da esfera e
r = raio da esfera.
O volume de uma esfera é dado por:
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(4) |
em que:
V = volume e
r = raio.
A relação superfície/volume é calculada por:
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(5) |
Com esta última equação pode ser observado que, à medida que se diminui o diâmetro das gotas, a relação superfície/volume aumenta, o que contribui para a aceleração da evaporação. A Tabela 7 ilustra o tempo de vida e a distância de queda de gotas de diferentes tamanhos, em diferentes condições de temperatura e umidade relativa. O tempo de vida é calculado pela seguinte fórmula:
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(6) |
em que:
t = tempo de vida em segundos;
d = diâmetro das gotas (μm); e
∆T = diferença de temperatura entre termômetros de bulbo seco e úmido (ºC).
A distância de queda é calculada pela seguinte fórmula:
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(7) |
em que:
D = distância de queda (cm) e
d = diâmetro das gotas (μm).
Sob condições tropicais, a velocidade com que as gotas diminuem de tamanho é muito grande. Assim, Johnstone e Johnstone (1977) recomendam que as pulverizações de formulações à base de água, de 20 L/ha a 50 L/ha, e com 200 μm a 250 μm, devem cessar quando ∆T – diferença entre as temperaturas de bulbo úmido e seco de um psicrômetro – exceder 8 °C, ou a temperatura do bulbo seco exceder 36 °C.
Uma gota em queda livre atinge uma velocidade constante – velocidade terminal – quando as forças do arrasto aerodinâmico contrabalançam a força gravitacional. No caso de gotas usadas normalmente em pulverizações agrícolas, essa velocidade é atingida dentro de 2 m do ponto de emissão. Em se tratando de pequenas gotas (de 20 μm a 60 μm), a aplicação da lei de Stokes é precisa, mas, para as gotas grandes, o desvio se torna significativo, e a sedimentação atual é resultado de um número complexo de fatores: tamanho, forma e escoamento interno.
Ao caírem no ar, as grandes gotas tornam-se achatadas e apresentam uma área frontal maior que a de uma esfera do mesmo volume. Esse efeito pode reduzir o arrasto e aumentar a velocidade de sedimentação. A densidade de viscosidade do ar também afeta a velocidade de sedimentação.
A Tabela 8 mostra as velocidades terminais para as diferentes faixas de tamanhos de gotas normalmente encontrados para líquidos com densidade igual a 1. Para líquidos com densidade muito diferente de 1, a equação de Stokes, a seguir apresentada, pode ser usada:
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(8) |
em que:
Vs = velocidade de sedimentação (m s-1);
g = aceleração gravitacional em (m s-2);
ρ = densidade da gota (kg m-3);
d = diâmetro das gotas (m); e
η = viscosidade do ar (Ns m-2).
Por essa equação, a velocidade é proporcional ao quadrado do diâmetro.
Tabela 8. Velocidade terminal de gotas de diferentes tamanhos.
Tamanho das gotas (μm) | Velocidade de sedimentação (m s-1) |
20 | 0,012 |
40 | 0,047 |
60 | 0,102 |
80 | 0,175 |
100 | 0,270 |
120 | 0,355 |
160 | 0,536 |
200 | 0,705 |
250 | 0,940 |
300 | 1,150 |
350 | 1,200 |
400 | 1,630 |
500 | 2,080 |
Fonte: Quantick (1985).
O conhecimento da velocidade terminal de queda de uma gota é importante porque, quanto menor o tamanho dela, mais tempo ela gastará para depositar-se e, durante esse período, ficará sujeita à ação da evaporação e do arraste pelo vento para fora da área-alvo, originando a “deriva”.
O movimento perigoso do produto químico para fora da área intencionada (deriva) origina-se do fato de, após serem emitidas pelo bico de pulverização, as gotas flutuarem no vento por um determinado período. As gotas pequenas – que apresentam maior relação da superfície/peso e menor velocidade de queda – apresentarão, consequentemente, maior distância de deriva. Quantick (1985) apresenta uma tabela que indica a distância de deriva de gotas de diferentes tamanhos (Tabela 9).
Tabela 9. Distância da deriva de gotas liberadas a 3 m de altura, num vento com velocidade constante de 1,34 m por segundo, considerando-se que não ocorra evaporação.
Diâmetro da gota (μm) | Distância da deriva (m) |
500 | 2,1 |
200 | 4,9 |
100 | 15,25 |
30 | 152,50 |
15 | 610,00 |
Fonte: Quantick (1985).
O perigo da deriva é proporcionado pela possibilidade de o produto químico aplicado atingir outras culturas, e sua extensão depende, evidentemente, da toxidade do produto aplicado. Além disso, a deriva causa perda do produto e reduz a eficiência da aplicação.
Todos os pulverizadores têm três pontos em comum:
O bico do pulverizador é, precisamente, o final de um conduto pelo qual o líquido emerge na forma de jato. Neste capítulo, em particular, o termo bico é usado com um sentido mais amplo e pode ser qualquer dispositivo pelo qual o líquido é emitido, quebrado em gotas e dispersado a uma determinada distância.
O propósito geral da pulverização é aumentar a área de superfície de uma massa líquida para facilitar a ação de determinados processos físicos ou químicos. Na agricultura, o processo pode consistir em dispersar um volume de líquido num determinado volume de ar muito maior, ou em dispersar o volume numa grande área, de maneira que a área de superfície expandida do líquido seja transferida para a outra área.
A pulverização, ou a quebra do líquido em gotas, é, primeiramente, função da aplicação de uma força maior que a força de tensão superficial do líquido, para criar uma superfície extremamente expandida na forma de gotas. Esse fenômeno demanda energia, e o dispositivo usado para pulverizar o líquido – o bico – tem, na maioria dos casos, sua potência fornecida por máquinas.
De acordo com a fonte de energia para produção de gotas, os bicos de pulverização têm sido classificados em:
Os bicos hidráulicos caracterizam-se por serem baratos e de fácil fabricação, e isso tem contribuído para sua ampla utilização na agricultura. Todavia, produzem gotas com espectro pouco uniforme, ou seja, gotas com tamanho bastante variado. Por produzirem gotas com faixa de tamanho bastante estreita, os bicos de energia centrífuga surgiram como uma alternativa aos bicos hidráulicos atualmente empregados (Figura 2).
Figura 2. Pulverizador manual com bico centrífugo.
Foto: Aldemir Chaim
Nesse sistema, o líquido é lançado no centro de um disco rotativo, o qual promove o seu espalhamento, pela ação da força centrífuga, para a borda, na qual são formadas as gotas. Sob ação de ondas aerodinâmicas, a delgada lâmina de líquido presente na borda do disco se transforma, a princípio, em finos filamentos e, subsequentemente, em gotas.
O diâmetro das gotas produzidas depende diretamente da vazão e inversamente da rotação, ou seja, quanto maior a vazão maior o tamanho das gotas; quanto maior a rotação menor o tamanho delas. Como as gotas são projetadas em direção perpendicular à borda do disco, a penetração delas no interior das plantas é muito prejudicada.
Na Europa, esse tipo de bico tem sido utilizado para a fabricação de equipamentos que são empregados, na maioria dos casos, na aplicação de herbicidas.
Analisando-se os dois processos de produção de gotas já descritos, observa-se que ambos têm duas características básicas comuns, entre as quais a primeira é transformar o líquido numa lâmina muito fina, e a segunda, promover a aceleração dessa lâmina até uma velocidade muito grande, de tal maneira que o choque do líquido, em alta velocidade, com o meio gasoso da atmosfera relativamente parado, provoque a sua ruptura em gotas (Figuras 3 e 4). Pode-se dizer, assim, que as gotas são formadas pela diferença relativa de velocidade entre o líquido e o ar.
(1) Corpo do bico. (2) Capa de pulverização. (3) Eletrodo de indução. (4) Eletrodo de aterramento. (5) Parafuso de conexão de cabo de alta tensão. (6) Mola de conexão. (7) Parafuso de conexão do cabo de aterramento. (8) Tubo de alimentação para líquido. |
(9) Entrada de líquido. (10) Entrada de ar sob pressão. (11) Direção do deslocamento do ar comprimido. (12) Fenda interna de escoamento de líquido. (13) Fresta anular de emergência do líquido. (14) Orifício de escape de ar do corpo do bico. (15) Orifício da capa de pulverização. |
Figura 3. Desenho de um corte lateral do bico pneumático eletrostático, desenvolvido para aplicação de inseticidas biológicos em florestas de eucalipto.
Fonte: Chaim et al. (1999b).
(1) Corpo do bico.
(3) Eletrodo de indução.
(4) Eletrodo de aterramento.
(7) Parafuso de conexão do cabo de aterramento.
(9) Mangueira de admissão de líquido.
(11) Direção do deslocamento do ar comprimido.
(12) Fenda interna de escoamento de líquido.
(13) Fresta anular de emergência do líquido.
(14) Orifício de escape de ar do corpo do bico.
(16) Gotas com carga eletrostática.
Figura 4. Detalhe do funcionamento do bico pneumático eletrostático.
Fonte: Chaim et al. (1999b).
Partindo-se dessa premissa, outra maneira de gerar gotas seria pelo aumento da velocidade do ar em relação ao líquido. E é exatamente esse o princípio empregado nos bicos pneumáticos, cuja invenção é muito antiga, pois, conforme descrito por Rose (1963), um inventor pediu patente para um dispositivo que utilizava esse processo em 1845, o qual foi muito utilizado em aplicações de agrotóxicos no fim do século 19.
Atualmente existem vários tipos de bicos pneumáticos, mas seu maior emprego tem sido em processos industriais como: combustão de líquidos inflamáveis para fornalhas, motores a pistão; motores e foguetes a jato; evaporadores e secadores (leite em pó); umidificadores e pistolas de pinturas. Na agricultura, esse tipo de bico tem sido utilizado, basicamente, em alguns modelos de pulverizadores motorizados costais (Figura 5) e em determinados tipos de equipamentos tratorizados, como os “canhões”. Recentemente, foi lançado nos Estados Unidos um bico pneumático do tipo leque para aplicação de herbicidas.
(1) Saída do ar.
(2) Eletrodo de indução.
(3) Suporte de sustentação do eletrodo de indução.
(4) “Margarida”.
(5) Tubulação de condução do líquido.
Figura 5. Bocal pneumático eletrostático de baixa pressão, para uso em pulverizadores costais motorizados.
Fonte: Chaim et al. (2002).
Apesar de a pulverização eletro-hidrodinâmica ser empregada desde a década de 1960 em processos de pintura eletrostática e, mais recentemente, em impressoras a jato de tinta para computadores, o seu uso na agricultura só foi possível com o desenvolvimento do “Electrodyn”, projetado por Coffee (1979), com o suporte da multinacional inglesa Imperial Chemical Industries para desenvolvimento das formulações adequadas ao processo.
No Brasil, Chaim (1984) desenvolveu um protótipo manual (Figura 6) testado com sucesso no controle de tripes em amendoim, usando, para isso, uma formulação especial de deltametrina. A importância de se incluir esse processo de geração de gotas neste capítulo deve-se ao fato de ele ser extremamente revolucionário. É praticamente desconhecido do público, mas apresenta um futuro muito promissor na redução dos desperdícios que ocorrem nos processos hidráulicos comuns.
Figura 6. Bico eletro-hidrodinâmico ilustrando os ligamentos líquidos que se transformam em gotas durante a pulverização.
Foto: Aldemir Chaim
No processo eletro-hidrodinâmico, utiliza-se um método denominado indução eletrostática, no qual o líquido é submetido a um intenso campo eletrostático que promove o aparecimento de cargas na sua superfície, as quais produzem força cujo sentido é oposto ao da força da tensão superficial.
Quando a força decorrente das cargas é superior à força da tensão superficial do líquido, ocorre uma instabilidade hidrodinâmica na superfície que provoca o aparecimento de pequenas cristas, das quais são formadas as gotas. Num bico de geometria cilíndrica, o campo eletrostático criado organiza-se em linhas de força com simetria radial e promove o surgimento de dezenas de cristas que, por sua vez, dão origem a finos filamentos líquidos num padrão de cone vazio. Na extremidade de cada um desses filamentos, as cargas se acumulam com maior intensidade, e, quando atingem um nível crítico, o líquido se rompe em gotas.
Como o campo eletrostático e a tensão superficial são constantes, assim como o é também a taxa de escoamento de líquido, há formação de gotas, com cargas elétricas e tamanhos extremamente uniformes. Portanto, o tamanho das gotas depende, fundamentalmente, da tensão superficial, da intensidade do campo eletrostático e de determinadas características físicas do líquido. Dessa forma, somente líquidos especiais podem ser pulverizados por esse processo. Óleos minerais e vegetais reúnem algumas das características físicas adequadas para serem usados nesse tipo de pulverização; embora precisem antes ser aditivados com solventes polares para melhorarem a condutividade elétrica e a tensão superficial.
Em testes rápidos realizados em laboratório da Embrapa Meio Ambiente, e ainda não publicados, com uma mistura de óleo mineral medicinal (Nujol) e ciclohexanona, obteve-se uma taxa de deslocamento de carga de 0,7 microampere, com um bico operando em uma vazão de 6 mL/min (equivalente à aplicação de 1 L/ha) e 25 kV de tensão. Isso produziu uma relação carga/massa de, no mínimo, 7 microcoulombs por grama, o que é um excelente nível. Para produzir essa pulverização, o bico consumiu cerca de 18 miliwatts de potência, o que torna esse processo o mais econômico do mundo, e com excelentes possibilidades de uso na agricultura.
Outro fator a ser considerado é o fato de as gotas produzidas apresentarem carga elétrica. Quando uma nuvem de gotas, eletricamente carregada, aproxima-se de uma planta, ocorre o aparecimento (por indução) de cargas de polaridade opostas na superfície do vegetal; e, como cargas opostas se atraem, ocorre um expressivo aumento na deposição de gotas por toda a planta, até mesmo na face inferior das folhas, o que reduz, consequentemente, as perdas para o solo.
Endacott (1983) demonstrou que, com a pulverização eletro-hidrodinâmica, a mortalidade de organismos do solo é 20 vezes menor que aquela decorrente da pulverização hidráulica convencional.
Os bicos hidráulicos extraem a energia para a pulverização da pressão a que o líquido é submetido, e, atualmente, são os mais utilizados no mundo para a aplicação de agrotóxicos. Uma bomba hidráulica, ou tanques pressurizados, é utilizada para suprir a energia necessária para a pulverização.
Os bicos hidráulicos podem ser subdivididos em grupos que basicamente descrevem as características do jato emitido. Há, assim, bicos de jato cônico cheio, bicos de jato cônico vazio e bicos de jato em leque (Figura 7).
Figura 7. Jatos cônico cheio, cônico vazio e em leque.
Um bico cone é constituído de diferentes peças, conforme apresentado na Figura 8.
(1) Corpo.
(2) Filtro.
(3) Núcleo.
(4) Disco.
(5) Capa
Figura 8. Constituição do bico cone.
O bico de jato cônico possui um dispositivo interno com uma ou mais aberturas, o qual, em inglês, é denominado de core e, em português, recebe uma série de outros nomes como, por exemplo, caracol, difusor ou núcleo. Esse dispositivo tem como finalidade promover, numa pequena câmara antes do orifício de saída, uma rotação que faz que o líquido saia tangenciando a borda circular do orifício na forma de uma fina lâmina cônica que, com a expansão, rompe-se em gotas. Dependendo da pressão exercida e do diâmetro do orifício de saída, em muitos casos tal lâmina não se forma, e o jato de gotas já emerge diretamente da ponta do bico.
Nos bicos da Spraying Systems, o núcleo recebe uma codificação numérica, como 13, 23, 25, 45, etc., cujo primeiro algarismo indica a quantidade de aberturas nele existentes, e o segundo, o tamanho de cada uma delas. Por exemplo, o núcleo nº 45 possui 4 aberturas de tamanho 5. Já o disco, esse recebe uma codificação alfanumérica, como D2, D4, D5, etc., em que o número após a letra D indica o diâmetro do orifício (ex.: 2/64", 5/64"). Da combinação núcleo/disco, resulta a identificação do bico (ex.: D2-13, D4-45).
Nos bicos da marca Jacto, o núcleo é identificado pelo número de furos: o núcleo 1 possui um furo, o núcleo 2 possui dois, e assim por diante. O disco Jacto é codificado apenas por números, como 10 ou 14, por exemplo, os quais também indicam o diâmetro de seu orifício (1,0 mm e 1,4 mm, respectivamente). A identificação do bico Jacto é feita assim: JDl4-1 (disco 14, núcleo de 1 furo); JD10-2 (disco 10, núcleo de 2 furos).
Nos bicos de jato em leque, amplamente utilizados na aplicação de herbicidas ou em pulverização em superfícies planas, o líquido é forçado a passar por um orifício de forma elíptica ou retangular. Comparados aos cônicos, esses bicos trabalham geralmente com pressões inferiores e fornecem opções para que se trabalhe numa ampla gama de vazões e de ângulos de pulverização (Figura 9).
(1) Corpo.
(2) Filtro.
(3) Ponta.
(4) Capa.
Figura 9. Tipo de bico leque, em que o jato é originário de um orifício elíptico da ponta (3).
Como a maioria dos herbicidas é aplicada na superfície do solo, arraigou-se a crença de que o leque é o bico para a aplicação de herbicidas. Contudo, o bico leque é indicado também para a aplicação de inseticidas e de fungicidas no solo, pois, na escolha do tipo de bico, o que se deve levar em conta é o alvo.
Deve-se considerar, também, que, no bico cônico, o líquido perde energia quando efetua a rotação antes de sair pela ponta, e, por isso, o seu jato não tem velocidade suficiente para penetrar em regiões medianas e inferiores afetadas nas plantas, caso em que um bico leque de ângulo de jato mais estreito poderá oferecer maiores vantagens de penetração que o bico cone, por seu jato atingir maior velocidade e gerar turbulências desejáveis para melhorar a deposição.
Na Figura 10, é mostrado o esquema de bico leque da série Teejet da Spraying Systems Co., em que a codificação numérica obedece à seguinte notação: os primeiros dois (ou três) algarismos indicam o ângulo de abertura do jato, à pressão de 40 lbf/pol²; e os demais algarismos à direita indicam a vazão, em galão por minuto. Exemplificando: o nº 8.002 (lido como 80-02) indica que o bico, operado à pressão de 40 lbf/pol², produz jato com 80 graus de abertura, e sua vazão é de 0,2 galão/minuto. O nº 11.004 (a ser lido como 110-04) designa o bico com jato de 110 graus de abertura, e vazão de 0,4 galão/minuto, à pressão de 40 lbf/pol².
(1) Corpo.
(2) Filtro.
(3) Ponta.
(4) Capa.
Figura 10. Tipo de bico leque de impacto, em que o jato é formado por uma ponta (3), na qual o líquido colide com uma superfície plana.
Num outro tipo de bico similar a esse, ao emergir de um orifício, o líquido choca-se com uma superfície plana e oblíqua e também produz um jato em forma de leque (Figura 10). Contudo, esse segundo tipo de bico leque trabalha com pressões menores (padrão de 10 lbf/pol²) e caracteriza-se por produzir gotas relativamente grandes e menos propensas à deriva.
Por possuir ângulo bastante aberto, esse segundo tipo de bico leque é apropriado para a aplicação bem próxima do alvo (solo) e é por isso mesmo preferido para equipar barras cobertas para a aplicação de herbicidas sob a saia de árvores e de arbustos (pomares, cafezais). Entretanto, se utilizado a pressões muito superiores à recomendada, esse tipo de bico de impacto gerará muitas gotas pequenas sujeitas à deriva. Os bicos da série Floodjet da Spraying Systems são codificados pelas letras TK seguidas de um número (ex.: TK-2), em que o número indica a vazão do bico a 10 lbf/pol².
Foi introduzido no Brasil um tipo de bico leque com indução de ar (Figura 11), que, segundo os fabricantes, consegue introduzir pequenas bolhas de ar nas gotas. As gotas produzidas por esse tipo de bico são muito grandes e, portanto, adequadas à aplicação de produtos para redução de deriva. É um tipo de bico adequado para aplicação de herbicidas e fungicidas sistêmicos.
Figura 11. Bico leque com indução de ar.
Os bicos, ou apenas as pontas de pulverização, são fabricados com materiais de diferentes graus de resistência ao desgaste por abrasão e à corrosão por ação de produtos químicos, cujas características são apresentadas na Tabela 10.
Tabela 10. Classificação da resistência dos materiais utilizados na fabricação das pontas de pulverização.
Material | Característica |
Latão | Baixa resistência ao desgaste, principalmente na pulverização de formulações do tipo pó molhável, além de ser especialmente suscetível à corrosão, principalmente com o uso de fertilizantes |
Aço inoxidável | Boa resistência ao desgaste; excelente resistência à ação dos produtos químicos; e orifício durável |
Aço inoxidável endurecido | Alta resistência ao desgaste; boa durabilidade e resistência à ação de produtos químicos |
Polímeros | Resistência ao desgaste variável de média a boa; boa resistência à ação de produtos químicos; orifício facilmente danificável durante a limpeza |
Cerâmica | Muito alta resistência ao desgaste; e bem resistente à ação dos produtos químicos abrasivos e corrosivos |
No Brasil, são comercializadas diferentes marcas de bicos de pulverização, e cada fabricante adota uma codificação própria para identificar os seus produtos, em conformidade com vazão, ângulo de jato, cor de ponta, material de fabricação, etc. Assim, o usuário deverá solicitar do fornecedor as tabelas de bicos de sua marca preferida e, na escolha do produto, levar em consideração o tipo de calda que utilizará, o tamanho das gotas adequadas ao alvo, a vazão, a pressão de trabalho, o tipo de equipamento em que o bico será utilizado, etc. Contudo, o grau de cobertura no alvo e o tamanho de gotas necessário para o controle do problema fitossanitário deverão ser os parâmetros orientadores da escolha adequada de bico.